Essa história começou há três dias.

Sabem quando você testemunha uma cena que na hora não dá importância e passado algum tempo, você se vê em uma situação complicada, tudo por causa daquilo que você viu e não entendeu bem? Pois esse é o rolo no qual me meti.

Sábado, 09:30 h.

Estou sentado na mesa da sala, sendo encarado pela minha mãe, que quer arrancar meus intestinos pela goela porque me pegou enfiando o celular novinho (que ganhei no último Natal) no copo de suco. Propositadamente.

Ela fala sem parar, preocupada comigo, achando que pirei com tantos games e seriados. Culpo a Pestinha, o que pega mal. Agora ela pensa que eu tenho mania de perseguição por sempre acusar a minha irmã. Pô, mas é verdade! Essa criatura maligna tem participação em quase tudo que acontece de ruim comigo. Eu tenho certeza que Pestinha treina em mim o seu plano de dominação mundial. Opa… meus pensamentos foram interrompidos: Mamãe parou de mexer a boca e está me olhando com uma cara muito feia.

– E aí, Max? O que você tem a dizer em sua defesa?

Respiro fundo, e faço um pedido: que me escute até o final! A cena em minha cabeça retorna ao início, como um filme sendo rebobinado, e estamos novamente na última quarta-feira, por volta dás 16 h, no meu quarto. Acabei de fazer o dever de casa e resolvo tomar um copo d’água. No caminho, cruzo com Pestinha e Alice, saindo do banheiro, às gargalhadas. Assim que nos esbarramos, ambas param de rir e percebo Pestinha escondendo as mãos para trás.

– O que vocês duas estão aprontando, hein?

– Nada não.. – responde minha irmãzinha, para logo depois saírem correndo.

Dei de ombros, pensando que algum coitado eleito como crush dela, deveria estar em intenso sofrimento e segui com a minha vida.

Quinta, 09:40h – hora do intervalo na escola.

Encontro a Carol sentada no seu ponto predileto, embaixo da árvore do pátio, com as amigas. Como menina conversa alto! E as risadas e gritinhos estridentes?! Meu Deus!! Garotas e garotos são tão diferentes. Imaginem que ridículo, Felipe e eu dando pulinhos e tapinhas um no outro, acompanhado de gritinhos por algum motivo tosco. 😒😒

Entre um gritinho e outro, conseguimos entender que estava rolando entre as meninas algum tipo de simpatia para atrair o crush. Aparentemente seria necessário que a garota conseguisse alguma coisa pessoal da vítima. Tinha até uma tabela, e quanto mais íntimo, mais apaixonado o dito cujo ficaria. Precisa ser meio boba para acreditar que essas macumbas funcionam.

Voltei para casa, e na mesma quinta-feira, depois que tomei banho, percebi que minha escova de dentes tinha sido trocada. Olhei a da Pestinha e era a mesma. A escova de cabelo também estava limpa e nem era dia de faxina da Chica. Esperei minha mãe chegar em casa e ela não sabia de nada. Comecei a ficar com a pulga atrás da orelha. Muito estranho. Decidi que perguntaria à Carol essa história de simpatia/macumba no dia seguinte.

Sexta-feira, 09:50 h – hora do intervalo no Bosque (minha escola).

Vejo Carol indo comprar um lanche na cantina e resolvo perguntar.

– Que papo é esse que tá rolando das meninas fazerem macumba?

– Tá preocupado? Alguém pegou algo seu?

Menti. Eu estava em pânico, para falar a verdade.

– A Ana foi na Madame Baltazar, que a ensinou uma simpatia para atrair o crush. Como a Ana é legal, acabou dividindo com a gente. Funciona assim: basta conseguir um objeto pessoal, se for cabelo ou unha, faz ainda mais efeito. Aí, é só amarrar com um laço vermelho, colocar dentro da fronha e dormir por 3 dias, dizendo ao deitar umas palavras específicas.

– Céus! Basta isso? E Ana comentou quais eram as palavras com todo mundo?

– Calma.. Ela compartilhou nos grupos, mas tem mais uma condição para dar certo. Você já viu aquele filme O Chamado, onde a pessoa precisa ver uma fita para morrer sete dias depois?

Fiz que “sim” com a cabeça, imaginando que preferia estar nessa situação do filme do que em risco de me apaixonar pela Alice, e ela continuou.

– Para dar certo, o menino precisa depois dos três dias atender uma ligação feita pela autora da simpatia.

– E se ele não atender?

– Aí, não vai funcionar.

Sábado, 08:30 h – em casa.

Enquanto eu descia as escadas para tomar café, escuto o meu celular tocar sem parar. Ainda sonolento, quase atendi em modo automático a ligação de um número restrito quando então, me lembrei da macumba. Pestinha se aproximou de mim e vendo que eu não ia atender espontaneamente pressionou o dedão dela em cima do meu, justamente no botão verde. Desesperado enfiei o celular no copo de suco que ela carregava, enquanto minha mãe entrava na sala e assistia a tudo sem saber do plano demoníaco da minha irmã em me tornar um escravo amoroso da Alice.

– Pronto. Foi isso que aconteceu. Essa é a minha defesa. A mais pura verdade – falei, encarando minha mãe de boca aberta, após uma hora de explicação.

Moral da história: se seu filho, marido, amigo, etc… for pego fazendo algo absurdo, ele pode ter uma boa desculpa.

Campanha: por mais crédito aos injustiçados! 😬😬

P.S1: imagem do Carlos Ruas, de “Um sábado qualquer”.